quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Memorial da sagrada Universidade do Centavo

Retornaram os dois àquele lugar. Ela e ele. Embora updated em cores diferentes, outros olhares e alguns cantos fora de tom, era o mesmo lugar. O lugar aonde os fios de suas vidas se cruzaram. Sentiram aquele perfume de flores de sândalo. Era o mesmo lugar. O lugar aonde, desde sempre, sentiram-se um do outro. O lugar aonde um conhecera mais o outro. O lugar aonde um se consumia mais no outro. Fora ali o primeiro encontro dos incontáveis que tiveram. O primeiro olhar, o primeiro sorriso, o primeiro entrelaçar de mãos, a primeira fuga. A cada novo encontro, uma nova música que cantavam; o mesmo sabor de sorvete preferido; o mesmo instrumental compartilhado à distância; a mesma banda dividida; o mesmo sinal da cruz. Ali, só não trocaram juras de amor. Concordavam que por o amor não se deve jurar. Amor acontece. Foi assim com eles. Era só isso que entendiam. Não o que estavam a fazer, de início, ali naquele lugar. Haviam chegado em momentos diferentes. Não havia nada que aproximasse aos dois a não ser, talvez, por aquele sorriso no dia em que o calendário lunar marcava tempo de killing moon. Era chegada a hora no tempo do amor. Naquele espaço que pendurava na parede um indescritível quadro de uma família de lêmures, marcaram logo seu canto. De canto em canto, uma história começava a ser escrita. Foi dali que ganharam Salvador. Passou-se o tempo que não se pode contar. Eros vitoriosamente ainda os segurava pelas mãos enquanto entregavá-os aos cuidados de Zéfiros. Outra década, novo ano, mais um mês, outro dia e estavam ali novamente. Olharam-se no espelho junto à mesa onde costumavam sentar. Apesar de um eu e de um outro marcados pelo Tempo, agora aquele que conta os segundos, tudo era igual. Igual e diferente. O igual mostrava um sentimento que os prendia. O diferente mostrava um sentimento que vencia Chronos. Não precisavam voltar ali. Mas estavam lá. Relógio é dragão que quer engolir Amor. Música que adormece a alma. Voltar ali foi como uma viagem no tempo sem sair do lugar. Um chá, um café, pastéis de santa clara e o mundo seguiria ainda mais forte e constante. Estavam transformados. Ela já não era ela, simplesmente. Simplesmente, ele já não era ele...


"O amor só é lindo, quando encontramos alguém que nos transforme no melhor que podemos ser."

(Mario Quintana)



Zélia




sábado, 23 de agosto de 2008

entre a lua e a previsão do dia

"Mas não se pode agir assim, a amiga avisou no telefone. Uma pessoa não é um doce que você enjoa, empurra o prato, não quero mais. Tentaria, então, com toda a delicadeza possível, sem decidir propriamente decidiu no meio da tarde — uma tarde morna demais, preguiçosa demais para conter esse verbo veemente: decidir. Como ia dizendo, no meio da tarde lenta demais, escolheu que — se viesse alguma sofreguidão na garganta, e veio — diria qualquer coisa como olha, tenho medo do normal, baby."

(Caio Fernando Abreu)


Hoje decidi que a faxina seria em mim. E olha que não decido nada sem antes ler a previsão do tempo e meu horóscopo. Que posso fazer se acredito em signo? Sou de peixes e nado feito maluca pra chegar ao trabalho e ainda aguento a Dona da Fábrica me dizer que "esse atraso é ridículo". Ela fala assim - ridículo. Odeio o tom de voz. Parece que tem um problema de dicção. Quando a gente não gosta de algo, basta meia palavra pra a coisa toda explodir. E fico no trabalho. Olhando o relógio, olhando minhas unhas e colhendo pensamentos. Faço o típico interrogatório interior. Sou minha própria terapeuta. Sei exatamente como me sinto. Outra coisa. Odeio conselhos. Odeio mesmo. Me afasto como uma linda bolinha de gude. Fugindo e indo solta lá no horizonte. Já imaginou uma bola de gude azul cobalto indo embora? Sou eu. Indo, embora não vá. E hoje decidi tomar conta de mim. Anoto sensações. Estou engraçada. Sempre uso jeans. Sempre jeans. Minha cara de hippie dessa nova temporada. Hippie agora é vestir moda alternativa. Então visto. Se bem que, às vezes, o outro lado da lua me ataca e me visto como uma aeromoça. Cabelo todo arrumadinho. Mas quando me olho no espelho sei que não sou. A gente se conhece. É uma fato. Eu me conheço e não faço trato, nem traio, nem abstraio, nem calo a boca. Mas sou silenciosa. Um piano fechado e também digo que amo pianos, músicas e voz de mulher cantando. Eu canto. Pouco, mas canto. Quando bate a vontade, o violão me salva. Faço um show sozinha. Tão bom. O sol da tardinha, eu sozinha e canto feito a Joan Baez. Mas ela dizia que a resposta estava no vento. Ela e o Bob Dylan. Mas não quero resposta. Quero cuidar de mim. Me colocar pra dormir. Me dar banho. Me dar de comer. Comprar meu chocolate favorito e assistir todos os filmes que amo. As Pontes de Madison, Vanilla Sky, Orgulho e Preconceito e hoje assisto E o vento levou e entendo porquê o Rhett Buttler largou a maluca da Scarlet. Antes eu achava que ela estava certa só porque era mulher. Sou feminista. Sem causa, mas sou. Hoje sei que existe sempre outro caminho. Outro ponto de vista. Outra opinião. Peixes e arcos que preciso acompanhar. Cuidando de mim vou lembrando que nada vai valer minha exaustão. Ando cansada, mas vou sair. Tenho o tempo nas mãos e me ajuda a previsão porque hoje tô cuidando de mim e que o amor não esqueça. Só volto quando me sentir tão cheia da minha cara e isso vai demorar porque a gente se ama sempre. Somos eu e eu no caminho, meu lado folk e deixa a idade ser grande porque não volto, embora ainda esteja aqui. Sai do aquário e vou conhecer o outro lado da lua que mora no jardim.


Por Letícia Palmeira


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sábado, 16 de agosto de 2008

Revérbero

“Toda significação reenvia a outra significação.”

Jacques Lacan

in: A função criativa da palavra.


Um dia

Ainda te conto

O que é um conto

O conto da Carochinha

O conto em papel de parede amarelo

O conto pela queda da casa de Usher

O conto que contou o velhinho Maurice

O conto que embrulhou sabão

O conto que não diz a verdade

O conto que custou seis réis

O conto que abriu o mar

O conto que levou o abraço

O conto que encheu um livro

O conto que trouxe o sorriso

O conto, a historieta de Henriqueta

O conto, a estagnação de Alice

O conto, a conta perfeita

O conto, a espera por você

Mas, por hora,

Eu não te conto

O que é um conto.


Zélia























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quarta-feira, 13 de agosto de 2008

A um certo Anjo que responde pelo codinome Amor

Estou aqui
Você comigo
Te amo sempre sem tempo
Certo ou errado
Lembrado ou esquecido
Amanhecido ou anoitecido
Falante ou calado
Acordado ou dormido
Te amo simples
Te amo ainda
Te amo mais
Te amo contudo
Te amo sempre sem tempo
Você comigo
Estou aqui


Zélia





















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sábado, 9 de agosto de 2008

Texto solitário para um diário perdido

“Para que deve servir o Diário Íntimo?

1. para desabafar o coração;
2. para aperceber-se da vida;
3. para esclarecer o pensamento;
4. para interessar à [...] ” *

Que seja...

Hoje acordei do avesso. Dormi até umas 08h00min quando o U2 cantava sobre algo que ainda não encontrara. Eu até gostava da bendita canção mas depois que ela passou a ser meu despertador, percebi que quase tudo que busco está ao meu alcance. Além disso, percebi que aquela, agora musiquinha, estava me deixando deprimida com essa coisa de “ainda não encontrei o que estou procurando”, enquanto acordava para ir trabalhar. Troquei a musiquinha do alarme do meu celular pelo hino, instrumental, do Brasil. Pelo menos aquele som parecido com umas trombetas, do início do hino, me dá mais coragem para levantar – às vezes penso que estou em um quartel do exército. Entretanto, hoje era o meu marido quem precisava acordar – e não acordou. Pois bem. Estava a dizer que acordei do avesso. Senti vontade de limpar meu fogão, coloquei umas roupas na máquina, levei até à minha mãe um baú que ela estava precisando e até pensei em comprar um guarda-roupa pequeno para colocar em meu escritório. Espera um pouco... Guarda-roupas não devem ficar em quartos? Acho que sim! Mas como hoje estou do avesso, ele vai ficar no escritório mesmo. Tenho muitos edredons que não têm onde morar. Ainda do avesso, volto. O telefone toca. É minha escritora particular – ela escreve textos para mim e eu vou produzir o livro dela. Conversamos, como sempre, horas a fio. Fomos interrompidas, é claro, algumas vezes, pelo menino da bola azul. Ele não pára de correr atrás daquela bola. Quase no fim da conversa, resolvi que eu iria escrever mais um texto. Como? Se eu estou extremamente ocupada com meus afazeres de voluntária de uma Ong que cuida da preservação do meio ambiente? Ah! Esqueci! Hoje eu tô do avesso. Vou sentar e escrever. O que é isso? O meu almoço. Acaba de chegar. Vou almoçar sozinha mesmo. O meu marido levou uns alunos a uma aula de campo e acaba de ligar dizendo que vai se atrasar – vai jogar cartas com um amigo antes de voltar. Ele está interessado em saber sobre o seu futuro e como vão estar as cotações da NASDAQ para o ano que vem. Tudo bem... Eu me atraso para o jantar. Vou ver como está o pingüim que apareceu lá em Cabedelo. No mais, não estou só. Estou almoçando com as letras que espalhei aqui. Meu prato preferido: cozido. Sempre fui de comer pouco mas quando era dia de cozido lá em casa, e era o meu pai quem cozinhava, o tamanho do meu prato assustava até elefante. Hoje não como mais assim. Ele não cozinha mais para mim. Se bem que, como hoje estou do avesso, eu poderia até comer mais. Não. Vou deixar um pouco para o jogador de cartas. Curioso eu estar aqui falando essas coisas. Nunca fui de escrever diário. Será que antes é que eu estava do avesso? Sei lá! Agora está na moda escrever diário em blog. Eu tenho um blog também. Pelo menos, com relação a isso, não estou do avesso. Principalmente agora que pareço estar escrevendo em um diário. Então viva! Há sempre uma primeira vez pra tudo. Sem contar que o blog é meu e nele eu escrevo o que quiser. Sou Escritora! Escritor é aquele que domina as palavras e isso eu faço bem. Coloco todas elas espalhadas no chão. Formo meu chão de palavras. Deito e rolo. Texto pronto! Vou publicá-lo. Talvez, eu tenha que acrescentar alguma coisa depois. Afinal, o dia está só na metade e eu ainda estou do avesso...

Zélia

* Extraído d’ un Journal Intime por Henri-Frederic Amiel

















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sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Flores enquanto escrevo


Uma nota é música enquanto som

O som é voz enquanto amor

O amor é arco-íris enquanto desenho

O desenho é mar enquanto estrela

O mar é céu enquanto azul

O céu é água enquanto chuva

A chuva é rio enquanto vida

A vida é arte enquanto poema.


Zélia



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