domingo, 30 de dezembro de 2012

Unha de Deus

Perdoe-me, padre, porque eu pequei. Subestimei meu inimigo. Fui avisada do quanto ele era poderoso, mesmo assim, julguei-me mais experta que ele. Caí. Queda alta. Desde então, passo os dias a juntar pedaços do que sobrou de mim. Pedaços do que éramos eu e ele. Eu não era apenas eu quando estava com ele. Eu era um eu + ele = nós. Eu era inteira. Agora sou pedaços. Pedaços que (se) partiram. Mas, pensando bem eu não deveria me sentir menos. Partida eu sou mais. Toda quebra implica em liberdade. Deixamos de ser um todo preso para sermos partes livres de amarras. Em pedaços posso correr solta, posso correr mundos, posso correr mais, posso correr múltipla. Prefiro-me assim despedaçada. Tão bom... Sinto não ter percebido isso antes. Não tinha olhos nem ouvidos até vir aqui. Foi o som que me levou à imagem da unha de Deus batendo ritmicamente em madeira de Lei que me devolveu olhos para ver e ouvidos para ouvir. Perdoe-me, padre, porque eu pequei.


Imagem: http://www.behance.net/