domingo, 30 de dezembro de 2012

Unha de Deus

Perdoe-me, padre, porque eu pequei. Subestimei meu inimigo. Fui avisada do quanto ele era poderoso, mesmo assim, julguei-me mais experta que ele. Caí. Queda alta. Desde então, passo os dias a juntar pedaços do que sobrou de mim. Pedaços do que éramos eu e ele. Eu não era apenas eu quando estava com ele. Eu era um eu + ele = nós. Eu era inteira. Agora sou pedaços. Pedaços que (se) partiram. Mas, pensando bem eu não deveria me sentir menos. Partida eu sou mais. Toda quebra implica em liberdade. Deixamos de ser um todo preso para sermos partes livres de amarras. Em pedaços posso correr solta, posso correr mundos, posso correr mais, posso correr múltipla. Prefiro-me assim despedaçada. Tão bom... Sinto não ter percebido isso antes. Não tinha olhos nem ouvidos até vir aqui. Foi o som que me levou à imagem da unha de Deus batendo ritmicamente em madeira de Lei que me devolveu olhos para ver e ouvidos para ouvir. Perdoe-me, padre, porque eu pequei.


Imagem: http://www.behance.net/

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Palavra ser.

O sopro a poeira tira.




Quisera poder
Toda palavra ser
Para não te ver fugir.
Sentir teu corpo,
Teu perfume,
Teu fogo,
Teu grito,
Olhos cerrados.
Depois do suspiro,
Ver teu sorriso.
E do teu coração,
Ouvir só o que se pode:
O Tum Tum Tummmmm
Acelerado e flamejante
Como somente
No momento em que
Te entregas por inteiro
Ao deleite da leitura.





Imagem da internet.

sábado, 8 de setembro de 2012

Desejo


sabe aquela casinha
de beira de estrada?
rosa fugidio em cima
da taipa,
uma porta e
uma janela,
crianças brincando
na frente?
paraíso a céu
aberto

sábado, 21 de julho de 2012

Eclética 4.0

“O que é um homem sem desejos, 
 sem liberdade de desejo e de escolha, 
 senão uma peça num órgão?” 

 Fiodor Dostoievski, in "Cadernos do Subterrâneo", 1873. 


Não é difícil falar de si quando não há disfarces. A questão é saber se tem alguém em algum lugar de nossa infinita, porém finita, galáxia que queira nos escutar. Muitos são os que negam, mas, a verdade é que o ser humano é egoísta demais para ser plural. Na hora em que o sapato aperta, eu sou singular. Não sigo mais do teu lado. Vou é cuidar de meu calo! Infelizmente. Assim, vivemos sós mesmo com uma lista imensa de amigos. Acontece que sou teimosa de natureza ariana (embora a astrologia não me convença). E falante. E escritora de letreiros. Eu não pedi pra nascer. Todo mundo já gritou isso pelo menos uma vez na vida. Comigo deve ter sido assim também. O fato é que estou viva e jamais questionei a razão de eu ser quem sou, de ser como sou, de ter nascido na família tal, morar no bairro tal, falar língua tal. Nunca questionei minhas alegrias nem tristezas. Sempre fui do time das análises, desde criança. Se havia algo errado, pensava sobre o fato e procurava resolver o problema do meu jeito. Muitas vezes, limitado e incapaz. Quando eu me olho no espelho ele não denuncia a idade que eu tenho. O que ele mostra são marcas do quanto amei e do tanto de felicidade que senti. Bem como mostra marcas do quanto sofri e do quanto chorei. Espelhos me mostram o quanto eu vivi. Espelhos me mostram que vivo. Lamento se meu modo de vida não agrada a todos. Lamento se sou pouco para todos e tudo que me cerca. Lamento. Só. Continuo vivendo. Do meu jeito, porém, me abrindo ou me moldando, sempre que possível, ao que esperam de mim. Tento sempre ser plural. Mas não me esqueço de mim. Apenas não espero muito do mundo. Talvez, por isso, alguns me estranhem. Não me preocupo mais em descobrir se o que sou me veio por escolha ou imposição. Não faço nada de forma obrigatória. Além do mais tudo na vida é escolha. Inclusive, não escolher. O comportamento humano é um complexo de escolhas que fazemos de forma proposital e dirigidas a satisfazer necessidades básicas que temos. Aquele que não pode escolher não tem vida (própria). Eu vivo! Eu desejo! Eu uso a minha liberdade de escolha! Escolhas não são fáceis. Sempre trazem consequências. Melhores ou piores. Maiores ou menores. Escolhas são, na maioria das vezes, pesadas. No entanto, é verdade que a certa idade, atingimos certo grau de maturidade que nos deixa mais livres e tudo fica mais leve. Eu estou assim: Livre, leve, eclética.


Image by Katosu on DeviantArt.