sexta-feira, 10 de julho de 2009

Clássico em preto e branco



"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousamos fazê-la, teremos ficado para sempre à margem de nós mesmos."
Fernando Pessoa



Ela não saiu
Fugiu
Vestido marcando
Ventre estufado
Ele não voltou
Ficou
Caminho em círculo
Levando ao mesmo lado
Ela toda bagagem
Ele álbum de retrato antigo
Esquecidos por si mesmos
Do lado de lá do que é
Um
E
Outro
Vida
E
Morte
Pedem travessia


Sofri o grave frio dos medos, adoeci. Sei que ninguém soube mais dele. Sou homem, depois desse falimento? Sou o que não foi, o que vai ficar calado. Sei que agora é tarde, e temo abreviar com a vida, nos rasos do mundo. Mas, então, ao menos, que, no artigo da morte, peguem em mim, e me depositem também numa canoinha de nada, nessa água que não pára, de longas beiras: e, eu, rio abaixo, rio a fora, rio a dentro — o rio.”
Guimarães Rosa em: A Terceira Margem do Rio


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