domingo, 4 de agosto de 2013

Um tanto anjo, um tanto diabo.

Falo demais, escrevo de menos. Instinto de sobrevivência. Ninguém me lê. É preciso vender a alma ao diabo para ser lido. É preciso vender a alma ao diabo para viver. Mas o diabo está pedindo um valor baixo demais pela minha alma. Toda fama, sucesso e dinheiro é muito pouco para se ter o que há dentro de mim. Acontece que, dentro de mim, também há o que é ruim. Coisa que o diabo gosta. Talvez, por isso minha alma tenha se desvalorizado tanto. Dentro de mim há amor de mãe. Dentro de mim há amor de mãe espalhados aos tantos filhos que não tive. Verbo no pretérito porque essa audácia não ousarei mais cometer. Dizem que, no plano terreno, amor de mãe é o que de mais próximos temos do amor genuíno. Sim, querida! Não basta amar. Nesta vida nada basta. Se ousar amar, tem que amar genuinamente. Amor genuíno mente? Não. Amor genuíno é santo. Eu sou quase santa. Eu sou quase besta. Santo é besta. Estou no quase. Eu amo as pessoas com servidão, exatidão e devoção quase santas. Porém, não me subestime. Não me tome como algo garantido. Por que algumas coisas cabem melhor em outra língua que em nossa própria língua? Se eu pudesse estampar em outdoor DO NOT TAKE MY LOVE FOR GRANTED, tudo ficaria tão mais claro. Eu chegaria ao meu equilíbrio. Falaria pouco, escreveria pouco. Todo mundo entenderia e eu não teria que mostrar ao diabo o que há de pior em mim. Minha alma seria mais valorizada. Acontece que não. Pessoas são estúpidas, o que há de pior em mim, aparece. É verdade. Devo admitir. Há um tanto de angelical em mim, mas há um tanto do que é diabólico. Não me queira como inimigo. Como seu inimigo serei tal qual uma lady. Lady Macbeth. Estarei desvirtuada da minha fração feminina e de todo o padrão feminino. Serei maquiavélica, cruel e manipuladora. Terei na cor vermelha o tom de minha vida. Entre mim e ela só há uma diferença. Meu espírito é desprovido de culpa. Não sinto o menor remorso em atormentar a sua vida. Não canso em repetir que só desempenho o meu papel. Amando ou odiando eu sou o que você me permite ser. Somos diferentes, somos iguais. Somos complemento um do outro. Dois lados da mesma moeda, duas faces da mesma cédula, sol e lua, águia e ar, lápis e papel, corda e violão, Aquiles e Pátroclo. Na junção do você e do eu, somos aquilo que preenche o intervalo que há em cada um de nós.  




Imagem: DeviantArt.

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Sem conexão


Eu só queria
Um abraço
Um amasso
Um espaço.

Eu só queria
Um lugar
Um alguém
Em quem coubesse
O tanto de mim
Que sobrou.



Imagem: Erin Cone.

domingo, 28 de julho de 2013

À (in)sustentabilidade das relações.

Se o mundo dá voltas, 
em que estação eu devo descer?


Voltei a escrever longas cartas para ninguém. O inverno nem é frio, mas, eu sinto calafrios. Agarrar um lápis traz calor as mãos. Todos saíram pela porta dos fundos e eu fiquei. Fiquei porque meu contorcionismo é falho. Eu não caibo em todo lugar. Nem todo lugar me cabe. Você, também, é um lugar. Lugar onde eu deveria encontrar abrigo, proteção, amor e cuidado sempre que precisasse. Eu preciso. Sou precisa. Essas coisas fazem de nós humanos vulneráveis, eu sei. Eu deveria ser alienígena. Ou um mutante.  

Cena faltando.

Não sou eu que dou abrigo? Que dou proteção? Que amo? Que cuido? Sim... Só que, agora, estou quebrada. E a consciência das pessoas não desapegou ainda da filosofia do quebrou, joga fora! Faz-se tempo de reciclagem. Acontece que reciclagem dá trabalho. É preciso manter aquilo que vai ser reciclado. Manter é proteger, é cuidar, é amar. Amar é, segundo os caprichos de Eros, convencional, belo e perfeito. Portanto, amar ao que não lhe convém, amar ao velho e amar ao torto é, no mínimo, desafiar o Cupido. Voltamos à reciclagem. O que dizer da reciclagem de pessoas? Pessoas são chatas, antissociais, imperfeitas. - Pois têm vontades e sentimentos próprios - Pessoas não pedem perdão, pessoas não perdoam. Espere... Talvez, eu deva descer em qualquer estação e seguir. Ou parar. Parar e só olhar o vai e vem de pessoas em trem cujo caminho é uma linha reta.



Imagem em: Deviantart. 

sábado, 20 de julho de 2013

Ao passar das coisas e da gente.

A gente passa
Passa o carteiro
Passa a lesma
Na calçada.

A gente passa
Passa o carro
Passa o trem
Na mesma pressa

A gente passa
Passa o fel
Passa o ferro
Ferindo igual
De Páris a lança

A gente passa
Passa o vento
(Passatempo)
Levando o que
Raiz não tinha.


À arte melodramática.


Imagem: It's all about art.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Por onde passa o sol, a chuva passa.

A gente se perde. Muitas vezes. Mas sempre consegue encontrar o caminho de volta – ou de uma volta. É capacidade inata aos seres viventes. Caminhar é viver. Enquanto a gente caminha, a gente vive. Enquanto a gente vive, a gente atua, disse o Bardo do Avon. Eu atesto, testo. Um passo, outro passo. Uma fala, outra fala. Um cenário, outro cenário. Um terreno, mortos enterrados e eu me enxergo contorcionista. Uma dobra pra cá, outra pra lá. Um quadrado, um triangulo, um círculo. Contorção é acrobacia. Não se vive e não se caminha sem acrobacias. Eu vivo, eu caminho, eu atuo. Em um circo de plateia contada e lona furada – para que passe o sol e a chuva passe – faço da minha parte a parte que me cabe a cada dia. Faça chuva ou faça sol ou que me doa mais ou menos.

“O gato bebe leite,
O rato come queijo
E eu, toco meu trabalho.” *

* Em O Palhaço (2011), direção de Selton Melo.

Foto: Stanislav Odyagailo.

terça-feira, 4 de junho de 2013

Quais são as cores de Frida?

Há um grito de vida que me desperta toda manhã. Vida em cor de movimento e espontaneidade. Que insistência. Hoje, não! Fecho os olhos, disfarço. A vida segue. Deitada, ainda, vejo a hora. São nove em ponto. Já foram seis e quinze e sete e vinte. Às oito e dez, terminei o café da manhã na cama. O dia seguiu nublado, percebi. Por alguns instantes, fraquejei. Uma preguiça descomunal tomou conta de mim. Mas, não é sempre assim? Não quis levantar e colorir o mundo. Gosto do todo e do tudo limpo, cheio de cor. Cor forte e viva. Para encobrir a verdade? Sim, claro! Nada é tão assustador e cruel quanto a verdade. Verdade é mal que não se cura. Tomado por ela uma pessoa jamais será a mesma novamente. A verdade queima. Arranca do corpo a pele que o protege. Tal qual queimadura, deixa marcas que ferem como águia que devora fígado. O mundo precisa de cores. Cores fortes e vivas! Uma parede rosa choque nesta sala cairá bem. A quem tem olhos para ver, minha feminilidade, sensualidade e romantismo. Tiro certeiro para atrair homens. No caminho que percorreremos para o quarto, um corredor com a energia e prosperidade do amarelo. Mulheres ricas são mais atraentes. Em meu quarto... Deixe-me ver... Uma cor para reforçar o meu romantismo azul da cor do céu. A mais fria das cores frias? Ah! Homem não sabe disso. É preciso dar a ideia de lealdade e fidelidade. Homem gosta disso. Homem? Eu deveria estar pensando em mim. Estou! Vou mandar pintar nuvens brancas em meu quarto. Assim, vou pensar que estou no céu. Pouco me importa se não é verdade. O que vale é o que vejo. Não quero verdade. Na frente da casa, um verde-oliva para dar a impressão que estou sempre pronta para a guerra. Só que você nunca está pronta, querida. Não. Não estou nem quero estar. Encher-me de terra, lama, suor e sangue? Nunca. Prefiro o refúgio de minha casa. Tudo limpo e colorido. Nada em tons de vermelho, branco, preto ou cinza. Essas são as cores da verdade. O poder destrói a inocência trazendo terror e depressão. A verdade deprime, atormenta, persegue. Toda vez que fecho os olhos ela está lá. Revejo lugares por onde passei. Lugares secos e áridos igual à gente daquelas bandas. Gente pobre, fedorenta. Gente de destino traçado: do vermelho do parto ao branco do pó que entorpece e ao vermelho do parto novamente. Agora, para sempre. Meu destino quem faz sou eu. Ele deve ser colorido. Cores fortes e vivas. Como as cores que encobriam o mundo da mulher que dá risada de sua própria tragédia.


 

Imagem em http://www.fridakahlo.org/moses.jsp - Moses (Nucleus of Criation) By Frida Kahlo, 1945

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Madalenas

Entre o ser que sou e o ser que estou, uma madalena. É o intervalo de que preciso para me equilibrar. O frio e os flocos de algodão caindo do céu me agradam mais que poderia imaginar. Minha culpa! Frio e neve me cabem de tal forma que eu poderia correr até a praça e me tornar parte dela. Congelada, assim como tudo que é vivo e o que não o é. Há sol no lado do hemisfério das águas. Sol de sombras mórbidas. Eu devia chorar. Não devia sorrir ou sentir essa felicidade besta. Em terras castelhanas, apesar do frio, o sol é brilho e traz a vida que grita. Meu equilíbrio distorce e eu preciso de outra Madalena. Talvez, eu me apegue tanto as madalenas porque deseje ser como aquela Madalena que largou tudo e fugiu. Mas, ao contrário dela, que teve os seus pecados perdoados quando deixou tudo para trás, os meus pecados começariam com a minha fuga. Viveria como pecadora fugitiva. Intervalo do intervalo. Não tenho certeza de que isso me agrade. Sou marinheira aprovada com louvor. Sempre enfrentei mar bravo. Fugir não me cai bem. Embora me canse, às vezes. Quanto aos pecados, estes me servem bem. O que me falta é só esse. O pecado de enfrentar a fuga. Meu equilíbrio oscila ainda mais e eu devoro outra madalena. Conhecessem essas madalenas, teriam me receitado uma por dia (para não engordar) ao invés das pílulas de açúcar e água. Conhecessem essas madalenas, seria reformulado um velho ditado inglês: Many magdalenas a day keep the doctor away. O médico e todos os males. Outra madalena, pouco me importa o quanto engorde, encerro o intervalo. Equilibro-me na linha bamba que me separa daquilo que sou e aquilo que estou. Sigo. Não fujo. 



Minhas Madalenas. :)
Inverno de um verão qualquer.