quarta-feira, 3 de outubro de 2007

A Filosofia das Formigas

Há fotografias que só saem coloridas. Aos olhos de Deus, por exemplo, o mundo é uma caixinha de lápis. – Uns mais outros menos – É do homem o poder de borrar a mais perfeita pintura de todos os tempos. Existem pessoas que parecem ver tudo ao contrário: do amor fazem a guerra,do claro fazem escuro,do átomo fazem a bomba,do riso fazem o choro,da vida fazem a morte - atirada pela janela,do simples fazem o caos...Devíamos, todos, ser como as formigas e escolhermos o caminho mais curto.Não o mais fácil. Mas o que nos leva direto ao ponto.


Zélia


O Circo chegou

Aprendi a costurar, mas costuro torto – foi em um circo que nasci. O meu cerzido é de letras. No vai e vem da agulha, formo palavras,monto minha tenda e armo meu circo.Um em cada esquina.O espetáculo já vem pronto. Sou eu mesmo o artista principal. Não sou triste e não sou poeta. Sou alegre.Mas não riu de tudo. Por isso, sempre preferi os mágicos. Não os palhaços. Sou o Mágico de meu circo e o meu circo é mágico. As palavras usadas em meu cerzido criam asas e saem como o pólen de uma flor que vai em busca de aconchego.Aquelas que caem em minha cartola transformam-se em coelhos que ganham um colorido novo a cada apresentação, a cada olhar do outro.Eis o sentido da arte.O espetáculo é criado pelo artista mas é visto pela platéia.É ela quem termina o texto.O artista escreve por escrever.E,escrever, é escrever e só.O que vem por trás disso é segredo de mágico...

Zélia


Liberdade esvaecida em pó de giz

A busca da felicidade é inerente ao ser humano. Sempre acreditei que buscar felicidade não significava ser ou estar triste. Mas cuidar para sempre me sentir livre nas minhas escolhas e decisões. Algo em que nunca acreditei foi que liberdade significasse fazer o que quiséssemos. Fiquei feliz em saber que não estava assim tão errada, nesse meu conceito de liberdade, ao ler A Ética do Cuidado de Si como Prática da Liberdade de Michael Foucault. Seguindo o ponto de vista do filósofo francês, eu poderia resumir a questão como sendo a liberdade o controle sobre nossos próprios desejos e vontades. Explico: Para Foucault, a expressão da liberdade de cada um está intimamente ligada ao cuidado que cada um tem de si. Alguém que se entrega ao alcoolismo, por exemplo, não está usando de sua liberdade. Uma vez que não tem o controle sobre seus desejos e vontades. E, segundo ele, esse controle vem do conhecimento. Diz o filósofo:

“Não é possível cuidar de si sem se conhecer. O cuidado de si é certamente o conhecimento de si (...) mas é também o conhecimento de um certo número de regras de conduta ou princípios.Cuidar de si é se munir dessas verdades...” pág.269

Tal número de regras de conduta ou princípios é estabelecido pela sociedade na qual nos encontramos, é claro. Munidos “dessas verdades”, devemos usar a ética como “prática racional de liberdade”. Partindo desse princípio, entende-se liberdade não como, simplesmente, o ato de se jogar tudo pro alto e sair correndo mas, como sinônimo de controle, domínio sobre desejos e vontades, como já mencionei aqui.Quem não cuida de si, ou porque bebe, ou porque fuma, ou porque é viciado em internet, cocaína – que são dois extremos mas vício é vício - , ou porque não se livra de seus medos, ou porque insiste em viver sofrendo, ou porque saiu nu no meio da rua, ou porque não foi votar na última eleição por decisão própria, não é livre...

Resumindo: ser livre é entender o jogo das tais “regras de conduta ou princípios” estabelecidos e determinar a sua posição pensando no cuidado que você deverá ter de si próprio. Eu jamais havia pensado em liberdade como controle. Especialmente sobre coisas, aparentemente, mais simples. Mas é óbvio que isso faz todo o sentido. Só podemos ser livres tendo o controle sobre aquilo que diz respeito a nós mesmos. E como isso nem sempre é possível, o importante é estarmos cientes de se aquilo o que entendemos como ser livre é realmente o melhor para nós. Isso fará a diferença!

Sem conseguir fugir dessa idéia de que liberdade é fazer o que é bom para mim, descobri um lugar onde não sou/ou não estou - definitivamente - livre: minha sala de aula. Uma vez que não faz bem para mim, saber que é preciso que se ofereça mais ao meu aluno: como material didático, por exemplo.Ou saber que posso, enquanto professora, oferecer mais a ele mas as condições para a realização do meu trabalho não são favoráveis, nem a mim nem aos meus alunos - devido ao grande número de alunos por turma ou porque o nível de conhecimento que alguns deles apresentam não é o mesmo partilhado pelo grupo no qual eles estão inserido. Ontem mesmo, recebi uma tabela que me indica o número de alunos que poderão ser reprovados ao final do ano, independente da disciplina. Pensei: o que significa poder reprovar um aluno? Infelizmente - ou felizmente, para mim - não estou sozinha nessa. Tenho ouvido muitos professores se queixarem do quanto se sentem aprisionados em suas salas de aulas por diversas razões. A educadora Tania Zagury, inclusive, lançou há pouco tempo o livro Professor Refém – Para pais e professores entenderem por que fracassa a educação no Brasil. Ainda não li seu livro, mas saber que cerca de 2 milhões de docentes, de escolas públicas e privadas em quarenta e duas cidades brasileiras partilham do mesmo sentimento que eu, faz com que eu não me sinta uma estranha no ninho.Ufa! Mas não alivia a minha angústia. Foi justamente pensando no título do livro da Tania, no que ouço de meus colegas, no meu espaço em sala de aula e no tipo de ensino que é oferecido agora no Brasil que me levaram de volta a Michel Foucault e a descoberta da minha liberdade perdida. Escolhi minha profissão ouvindo conselhos para alçar outros vôos e deixar a árdua profissão de professor de lado. Nessa época, eu já pensava que ser livre era fazer o que é bom pra mim. E ser professora era algo que me dava grande sensação de liberdade. Calma! Nem tudo está perdido e isso aqui não é uma carta de renúncia a minha profissão. Talvez, um desabafo. Porém, mais que isso, é o começo da minha viagem de volta em busca da minha liberdade enquanto professora.

Zélia Palmeira

Texto escrito para o Cecplin,UFPB.



terça-feira, 2 de outubro de 2007

Meu Diário...

Coisa antiga escrever diário, mas vivo dessas coisas antigas. Acho até que todos vivemos do momento que passou. São músicas e enormes textos que tratam do assunto. Também vivemos das fotos e recortes de jornal. Mas não é sobre isso que quero escrever. Já passou a vontade e acredito que retardar o passo nos torna um bando de relógios atrasados. Já fui relógio atrasado - hoje sou o passo adiante e olho distante p'ra alcançar o infinito. Hoje acordei querendo dormir um pouco mais e esse excesso de sono é o meu legado. Renovo minha contagem e meu egoísmo de quem compra um ingresso único e solitário. Mas também discordo da solidão. Vive só quem expulsa até a própria sombra. Para mim, criança crescida, nunca teremos essa chance de estarmos sós e a sós. Entre o silêncio de fim de música e o silêncio de fim de mundo, vem sempre o ruído alheio e esse é o estandarte da solidão que não existe. Também temos pensamentos que não nos deixam e a vontade de ser um dia qualquer. Calendários intermináveis somos todos e a verdade universal é que nem mesmo as estátuas vivem só. Tem sempre alguém por perto. Um mendigo qualquer, alguém fumando um cigarro e os carros que se desfazem em fumaça. Solidão é faz-de-conta. Nunca estamos sós. Nunca estaremos. Temos como companhia a correria e as chances que nos escapam. Sem esquecer que a solidão também é companhia - tardia ou não, lá está ela. Bem sentada e sorrindo - nosso bicho de estimação.

Alice