Gosto de sal na boca, sorriso de flor-de-lis, acordo pensando em você. Águas correm pelas margens que nos separam, nada é como antes. Não penso sempre em você. Não esqueço você todo o tempo. Ao me ver no espelho, vejo o mundo dentro de outros mundos. Meu mundo. Seu mundo. Mundo de nós dois. Meu e seu. Impenetrável. Pensar nisso faz de mim personagem de clássico literário. Personagem da verdade que se esconde. Segredo. Mentira, não. A mentira é a negação da verdade. Nós temos verdade. A nossa história existiu. Existe. É verdade que pertence a mim e a você e ao livro que escrevemos e não publicamos. Melhor assim. Meu personagem ganha um ar mais misterioso, ardiloso. Você veste personagem de Cary Grant. Nada mais clássico que “An affair to remember”. De livro a filme, a vida e ao que ficou. Ao que fez de nós quem somos. Vivemos o amor em sua forma mais plena. Amor que é estado de graça e de graça dado. Uma noite sob céu de estrelas de sol que levanta tarde. Não fizemos planos mas esperamos pelo encontro em que, enfim, poderíamos sentir sem medo ou culpa o que antes só era sentido por descuido de mãos teimosas ou por fingirmos esquecer o limite de separação que devíamos preservar. Era tarde, cidade vazia, corpos esquecidos. Um toque, você surge. Não sei se por Destino que se segue ou que se toma para si. Eu esperava. Poucas palavras. Corações querendo acalento. Canto sacrossanto. Limites rompidos, eu já estava em seus braços quando o telefone tocou. Queria me lembrar que em outro livro não era eu a personagem central do romance sem classe em cartaz. Não me importava. Você também não era personagem central do triangulo que me cercava. Você não se importou. Sozinhos, um mundo passara a ser nosso. Não vivemos um capítulo mas escrevemos um livro. Livro de nós dois. Palavras que me penetravam, memórias que eram cravadas em nós dois. O novelo que nos envolveu veio do fio de Ariadne. Fio que não se rompe. Éramos nós dois, de nós dois. Consumados em pecado, a felicidade se revela em três enquanto somos um. O sol já chama a lua, deixamos a cena. Mesmo tendo que preservar limites outra vez, estamos juntos. Vejo em seus olhos, no seu sorriso e em suas palavras de respostas imediatas. Sim. Ainda te chamo. Ainda me chamas. Ainda nos chamamos. Hermes chamamos. E nos atendemos. E compartilhamos nosso mundo em silêncio. Silêncio de nós dois. Silêncio que fala em forma de poesia. Você disse, eu aceito. Sou tua alma, você o meu poema.
E poesia se encontra
Em quem vê o mundo pelas janelas da alma
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