quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Eu mais tu rima contente.

Leitos perfeitos 
Seus peitos direitos 
Me olham assim 
Fino menino me inclino 
Pro lado do sim. 
 Caetano Veloso em: Rapte-me Camaleoa, Outras palavras, 1981.

Nem toda rima é perfeita. Permite-se a liberdade de sons. Nem toda rima é rica. Permite-se a combinação de sons entre palavras de mesma classe. Que o poema venha como for. Com rima emparelhada ou alternada, aguda ou grave. Que venha o poema sem rima nenhuma. Os tempos são outros. Não estamos mais na era dos Clássicos. O que não se permite é a banalização do poema. O que não se permite é que o poema venha sem amor, sem força, sem poesia, sem vida. É preciso ficar atento ao poema. É preciso ficar atento à vida. O ser humano vive por seguir tendências. A tendência é simplificarmos tudo. Depois que complicamos tudo, a ordem agora é simplificar. Não foi nada sério. O que é sério? Não tenho tempo agora, mas... Quando você terá tempo? Um dia a gente se encontra. Quando é ‘um dia’ no calendário? Ao simplificarmos as coisas, simplificamos demais, também, as relações entre pessoas. O nosso egoísmo e individualismo nunca ganhou tanta força quanto nos dias atuais. Um clique aqui, um recadinho ali e eu estou com você. Não, não está. Eu não escuto tua voz. Eu não sinto teu cheiro. Eu não te sinto. Cada clique me leva para mais longe. Já vivi o suficiente para dizer que ‘eu era do tempo de’. Sou do tempo do presente. Estou aqui. Vim te ver. Quero ficar contigo. Quando eu continuo a escutar que não devemos esperar demais das pessoas, - o que é ‘demais’? – meu medo cresce. Temo que nos afastemos mais e mais. Chegará o dia em que substituiremos todas as nossas relações por cliques? Espero não mais estar aqui... Por ora, eu quero é viver junto. Dividir, compartilhar na tua presença. Eu quero o eu mais tu. Não há dois sem que um não se permita estar com o outro. A relação entre pessoas só existe, só se fortalece se for uma relação bilateral e presencial. Uma relação em que não se sufoque o outro ou deixe de viver sua vida em função do outro. Mas uma relação em que um se divida com o outro. Se não houver disposição na partilha do eu pelo outro, com o outro, não existe, não haverá relação alguma. Existirá o que restou dela ou o que restaria dela - Às vezes, não dá tempo nem de criar os laços para serem desfeitos. Volto ao meu livro e penso que um dia o mundo era menos pesado por ser mais cheio. Mais cheio de gente se sentindo, se abraçando, vivendo junto. Quase amontoados como poemas em um livro. Divididos apenas por tema, página, estrofes e versos. Versos cheios de rimas por todos os lados.


Imagem em: It's all about art.