sábado, 27 de fevereiro de 2010

Minha vida em sarabanda

“A vida é louca
a vida é uma sarabanda
a vida é um corrupio...”

Mario Quintana.
A canção da vida in: Esconderijos do tempo.




Acordo em um dia em que o tempo parou. Assim como quando estamos cruzando um oceano em um avião. As horas se soltam do relógio, os dias se confundem no calendário e estações se invertem. Assim como quando os compassos de uma canção são esquecidos e paramos a música antes que ela termine. Descompasso ou um novo compasso? A vida é louca, diz o poeta da simplicidade. É a loucura ou a razão que é necessária pra se viver? Houve um tempo em que loucura e razão não andavam separadas. À época da revolução industrial, elas tomaram destinos diferentes. Teria a vida se tornado sana ou insana com todas as mudanças ocorridas? “A vida é louca. A vida é uma sarabanda”. Volta o poeta. Entendo que a vida apenas exige certo compasso. Não o da sarabanda espanhola mas o compasso que um corrupio nos dá. Nem sempre decidimos o tom que queremos seguir. A vida faz isso por nós. Por isso ela é louca. Por isso é uma sarabanda. Ela exige compassos. Quem não consegue segui-los estará fora da dança. Hoje, não posso dizer que dia é. Fui dormir ainda hoje e acordo com um hoje que não planejei. Há música tocando lá fora. Ela me chama para dançar. Devo seguir o ritmo da canção. Não importa se estou cansada, se esqueci os passos a seguir ou se não quero bailar. Se estiver feliz, bem disposta e com vontade de dançar a tal dança, melhor. Acontece que a vida é louca – por loucura, entenda-se a negação do conceito empregado pela medicina e sim algo que foge ao controle pretendido apenas. E corre. Dá rodopios. Faz piruetas. Por isso, ela nos cobra sempre a andar na contramão. Será mais feliz e forte aquele que conseguir seguir seus compassos. Eu, nesse dia que não sei qual é, vou seguir os compassos que me foram passados – o que não quer dizer que eu me saia bem. Assim como se entrega um script a um ator. Talvez por isso Shakespeare tenha dito que “a vida é um palco”. Palco e sarabanda. Céu e estrelas. O papel que deverei desempenhar neste dia sem data não será o mais difícil. É apenas o primeiro ato de uma peça de compassos incertos. Não sei se acertarei os passos. Só o Amanhã dirá. Mesmo que eu não saiba a que horas, a que dia ou a qual estação chegue esse Amanhã.






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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Flores de palavras




A poesia sensibiliza qualquer ser humano.
É a fala da alma, do sentimento.
E precisa ser cultivada.

Afonso Romano de Sant’Ana



Por isso eu faço poesia
Porque minh’alma fala
Meu sentimento chora
Quando minha voz não é ouvida
Quando não consigo te alcançar
Quando não me enxergas mais
Ou quando me alegro
Quando o sol me acorda
E a lua me beija
Eu escrevo poesia
Não podes dizer que assim não o seja
Minh’alma fala, meu sentimento clama
E há flores em meus jardins
Flores de palavras
Textos em ramalhetes
Se és humano
Tens que se sensibilizar com a minha dor
Dor que nem dói mais
Depois de um poema cultivado
Poema que me traz alívio e alento
Que expressa meu canto
Se não és humano o bastante
Me deixa quieto de vez
Vou me deitar entre minhas flores
E a cada pétala que eu juntar
Terei um outro verso
Para um novo poema



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sábado, 23 de janeiro de 2010

Amor de poesia

Ela me deu poesia. Eu não li. Não consigo decifrar linhas. Que dirá entrelinhas! Quando não se sabe ler, há sempre um preço a se pagar. Ela parte, fico eu, desfaz-se o nós. Sozinho, vejo de volta um mundo que só agora descubro. Frio, escuro, flores murchas na janela, céu sem arco-íris, pedra que não verte água. No chão, pegadas que não me deixam esquecer uma direção. Linha reta transformada em estrada sinuosa de meu tormento. Não soube ler poesia. Ela inteiro, eu pedaço, partes à parte. Aceito a minha morte por desamor a poesia. Toda poesia é amor. Não se recusa amor.


sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Coisa de Gato



1980 e alguma coisa. Quando eu era criança junto com as minhas irmãs, nosso passatempo preferido era nos imaginar nos anos 2000. Em nossos espelhos nos víamos sempre felizes, casadas e cheias de filhos. Igual a nossa mãe e tias. Na época, eu não tinha idéia do que isso representava. Só hoje me dei conta de que estávamos projetando para nós o mesmo futuro da mãe e tias que tínhamos. Estereótipos da “mulher perfeita”. Casa, marido e filhos para cuidar. Não fosse o Tempo a nos mostrar que podemos vestir fantasias diferentes a cada vez que olhamos em um espelho, pobre de nós!

2000 e alguma coisa. Chegamos aqui. Não somos mais crianças. Percebo que aprendemos algumas coisas ao nos vermos no espelho em tantas formas diferentes. Aprendemos coisas diferentes também. Uma de minhas irmãs é que não aprendeu muita coisa. Vive numa realidade alternativa só dela e de meia dúzia de pessoas que ela chama de amigos. Não somos “mulheres perfeitas”. Talvez, porque não temos os maridos perfeitos. Três estão casadas mas só uma tem filhos. Apenas dois. Minha mãe não tem tantos netos quanto tinha a minha avó. Nem minhas tias. Aprendemos que quanto menos filhos melhor e que mulher vive sem marido. Não tenho filhos. “E não sei mais se é só questão de sorte”.* O que vejo é que os anos esperados nos tiraram muito mais coisas que conseguimos prever...

* Renato Russo em: L’Âge D’Or





Foto de acervo particular.