A cigana não leu o meu destino. Nem pudera. Ao contrário dos gregos, creio em um só Deus. Sou católico apostólico romano brasileiro e membro do Apostolado do Sagrado Coração de Jesus. Vou à missa toda primeira sexta-feira do mês. Católicos não acreditam em destino pré-moldado. Deus nos deu o livre-arbítrio, faço o que quiser da minha vida. Muito bom para ser tão simples assim. Ando rodeado de abutres que parecem anunciar minha morte prematura. Um moço assim tão jovem como eu não pode morrer agora. Não por nada especial, não. Vivo só. Só com o meu Deus, só com o meu cachorro, só com o meu trabalho, só com a doença da minha mãe, só com minha sobrinha fugitiva, só com os problemas do meu irmão, só com o único livro que tenho, só com o meu remédio, só com a mulher da noite. Outro dia, roubaram algo valioso no escritório em que trabalho. Culpa de quem fica sozinho na sala do escritório no horário do almoço. Querem que eu pague o tal objeto. Não quero pagar. Já gastei dinheiro extra esse mês com a cirurgia de castração do meu cachorro. Não quero outros cachorros. Quero continuar só com ele. Billy Paul é o meu cachorro. – Intervalo para pensar como era bom quando eu era criança. Tinha vários cachorros. Todos caíram do caminhão da mudança quando viemos do interior para a capital. Acho que, por isso, não quero mais cachorros. Só o meu Paul. Billy Paul. – O escritório que fique sem o tal objeto valioso. Já tenho problemas dos outros demais. Estou cansado. Até dispensei a mulher da noite de hoje. Esta noite, vou ficar só. Só comigo e com mais ninguém.
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