quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Ceia Santa

Se quiseres conhecer alguém verdadeiramente, 
Procuras saber dela por ela mesma. 
Não por outras bocas.


Véspera de feriado ainda não é feriado. Pessoas trabalham enquanto outras já se divertem. Sentada à mesa em um barzinho famoso em bairro nobre de minha cidade, bebo uma taça de espumante atrás da outra. Espumante é bebida de mulherzinha. Não fosse pela minha altura, diria que sou mulherzinha. Porém, de salto alto, 1m e 80cm me deixam mais para mulherão que mulherzinha. Continuo bebendo espumante? Continuo. Não bebo para ficar mais alegre, não bebo para esquecer problemas. Muito menos, bebo para ter coragem. Bebo água porque meu corpo pede. Bebo suco para refrescar. Bebo refrigerante porque pensar em meus ossos mais fracos ainda não é suficiente para me fazer parar de bebê-lo. Bebo espumante porque tem gosto bom. Quatro ou cinco taças e eu o abandono. Caso contrário, dormiria à mesa em lugar público. E eu uso lugares públicos para outros fins. A intenção ali era me divertir um pouco. Aliviar a tensão dos últimos dias. No entanto, eu só conseguia pensar que não trabalharia a semana inteira enquanto todo o mundo trabalharia. Pensava que na véspera do feriado ainda havia gente trabalhando. Bobagem minha. Véspera não é dia. Só quando é tempo de Copa do Mundo que o Brasil para de trabalhar antes da hora. Ando tão boba ultimamente. Tão boba que nem consigo prestar atenção na conversa de meus amigos. Não é difícil acompanhá-los. Ora eu faço um gesto positivo com a cabeça, ora faço um gesto negativo. De vez em quando, um sorriso. Tudo resolvido. Meu pensamento voa longe e se fixa no outro lado da rua. Três crianças entre dez e sete anos. Conheço essas crianças. Estão sempre por aqui. Mas o que fazem a essa hora da noite, véspera de feriado, ainda por aqui? Eles trabalham guiando uma carrocinha puxada por um burrinho ainda criança, assim como os meninos. Juntos, eles passam o dia carregando papelão, garrafas plásticas, coisas que possam ser recicladas. Nunca vi um adulto com eles. Não desgrudo meu olhar um só segundo. Àquela altura, já nem sei mais se devia gesticular com um sim ou um não. Meu pensamento era mais de reprovação. É tarde, meninos. É véspera de feriado. Eu e minha bobagem. Até parece que estou falando de véspera de Natal. Tomara que na véspera do Natal eles, a essa hora, estejam esperando pelo Papai Noel. Não. Não é véspera de Natal. É véspera de 7 de setembro. Que, também, é uma grande data! Eles não deviam estar esperando pelo D. Pedro II? Uma parada. O mais velho dos meninos desce da carroça. Vai até uma senhora vendendo churrasquinho na esquina. Ele pede, humildemente, por um espetinho. A senhora o atende prontamente. Ele volta com um espetinho brilhando por refletir a luz no olhar daqueles que o aguardavam. Eu observava. Todo espetinho tem quatro pedacinhos de carne ou de frango. Eles são três meninos. Hora do jantar. O menino mais velho, parecendo imitar Jesus, reparte o pão. Se dirigindo aos outros meninos fala: “Um para você, outro para você, um para mim e outro para o burro”. Cai da cadeira mas, o meu estrondo, não foi suficiente para despertar a atenção de quem me rodeava. Levantei e me juntei aos meninos e ao burro para saciar minha alma e meu espírito. 
 



Image by Supawat5 On DeviantArt